quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A esquisitice global está aqui

A esquisitice global está aqui (Terra)

Gostei muito do artigo do Thomas Friedman, que mostra o quanto o poder econômico prepondera sobre a questão séria do aquecimento global. Embora não concorde com ele em todos os pontos, o alerta é importante para mostrar como os EUA estão divididos e muitos políticos e empresas aproveitam para semear a confusão... apenas até perceberem que podem ganhar dinheiro com a situação, aí mudarão de discurso.


De todos os festivais de bobagem que periodicamente tomam conta da política nos EUA, com certeza a mais ridícula é o argumento de que já que Washington está tendo um inverno com muita neve, isso prova que a mudança climática é um embuste e que, portanto, não precisamos nos incomodar com todas estas frescuras, como energia renovável, painéis solares e impostos sobre o carbono. Continuem perfurando, continuem perfurando.
Quando vemos legisladores como o Sen. Jim DeMint, da Carolina do Sul, escrevendo no Twitter que "vai continuar nevando até que Al Gore ceda", ou notícias de que os netos do Sen. James Inhofe, de Oklahoma, estão construindo um iglu próximo ao Capitólio, com um grande cartaz que diz "Novo Lar de Al Gore", realmente nos perguntamos se ainda podemos ter uma discussão séria sobre as questões referentes à energia e ao clima.
A comunidade científica e de estudos climáticos não é de todo inocente. Eles sabiam que estavam se levantando contra forças extraordinárias - das empresas petrolíferas e de mineração de carvão, que financiam estudos céticos a respeito das mudanças climáticas, dos conservadores, que odeiam qualquer coisa que possa levar a mais regulamentações governamentais, até a Câmara de Comércio, que resistirá a qualquer imposto relativo ao uso de energia. Portanto, os especialistas em clima não podem ficar vulneráveis pela simples citação de pesquisas que não foram revisadas por especialistas ou não respondendo a questões legítimas, algumas das quais foram colocadas tanto na Unidade de Pesquisa Climática, na Universidade de East Anglia, quanto no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU.
Embora ainda exista uma montanha de pesquisas realizadas por diversas instituições sobre a realidade da mudança climática, o público se tornou inquieto. O que é real? Em minha opinião, a comunidade científica que estuda o clima deveria convocar seus principais especialistas - de lugares como a NASA, o America's national laboratories, o Massachusetts Institute of Technology, Stanford, o Califórnia Institute of Technology e o Met Office Hadley Centre do Reino Unido - para produzir um simples relatório de 50 páginas. Eles poderiam chamá-lo de "O que Sabemos", resumindo tudo o que já sabemos sobre mudanças climáticas, com uma linguagem que alunos do sexto ano pudessem entender, com incontestáveis notas de rodapé revisadas por especialistas.
Ao mesmo tempo, eles deveriam acrescentar um resumo de todos os erros e exageros propalados pelos céticos em relação à mudança climática - assim como de onde obtém seu financiamento. Chegou o momento em que os cientistas que estudam o clima devem parar de jogar na defesa. O físico Joseph Romm, um dos principais estudiosos do clima, está postando em seu site climateprogress.org sua própria lista dos melhores artigos científicos sobre cada aspecto da mudança climática, para qualquer um que queira obter um resumo rápido agora mesmo.
Aqui estão os pontos que eu gostaria de enfatizar:
1) Deve-se evitar o termo "aquecimento global". Prefiro o termo "esquisitice global", porque é o que realmente acontece quando as temperaturas globais aumentam e o clima muda. O clima fica esquisito. O que era quente fica mais quente, o que era molhado fica mais molhado, o seco seca ainda mais e há mais tempestades violentas.
O fato de que temos visto tanta neve em Washington - ao mesmo tempo em que há chuva nas Olimpíadas de Inverno no Canadá, enquanto a Austrália está passando pelo recorde de 13 anos de seca - está de acordo com cada um dos principais estudos sobre mudanças climáticas: o clima ficará esquisito; algumas áreas terão mais precipitação do que nunca; outras ficarão mais secas do que nunca.
2) Historicamente, sabemos que o clima tem se aquecido e resfriado lentamente, passando das Eras do Gelo até os períodos de aquecimento, o que tem sido determinado, em parte, por mudanças na órbita terrestre e, consequentemente, na quantidade de luz solar que diferentes partes da Terra recebem. O atual debate discute se os humanos - ao emitirem tanto carbono e ao engrossarem a camada de gases de efeito estufa em todo o planeta, o que retém mais calor - estão rapidamente exacerbando os ciclos de aquecimento naturais da natureza, em um grau que poderia levar a transtornos perigosos.
3) Aqueles a favor de agir estão dizendo: "Já que o aquecimento causado pelos seres humanos é irreversível e potencialmente catastrófico, vamos fazer um seguro - investindo em energia renovável, eficiência energética e transporte público - até porque este seguro nos deixará mais ricos e mais seguros". Importaremos menos petróleo, inventaremos e exportaremos mais produtos feitos com tecnologias limpas, enviaremos menos dólares a países estrangeiros para comprarmos petróleo e, o mais importante, diminuiremos os dólares que estão sustentando os piores ditadores do petróleo no mundo, que indiretamente financiam terroristas e as escolas que os criam.
4) Mesmo que as mudanças climáticas provem ser menos catastróficas do que alguns temem, em um mundo que deve crescer de 6,7 bilhões para 9,2 bilhões de pessoas entre o atual momento e 2050, sendo que cada vez mais pessoas viverão como os americanos, a demanda por energia renovável e água limpa vai disparar. Esta será, sem dúvida, a próxima grande indústria global.
A China, é claro, entende esta questão, por isso investe pesadamente em tecnologias limpas, eficiência e transporte ferroviário de alta velocidade. Ela vê as tendências futuras e está apostando nelas. Na verdade, suspeito que a China esteja rindo de nós neste exato momento. Assim como o Irã, a Rússia, a Venezuela e toda a gangue da OPEP, que devem estar se cumprimentando. Nada serve melhor aos seus interesses do que ver americanos confusos sobre as mudanças climáticas e, assim, menos inclinados a desenvolverem tecnologias limpas e, portanto, com maiores chances de continuarem viciados no petróleo. Sim, senhor, há luto na Arábia Saudita.

Thomas L. Friedman é colunista do jornal The New York Times desde 1981. Foi correspondente-chefe em Beirute, Jerusalém, Washington e na Casa Branca (EUA). Conquistou três vezes o Prêmio Pulitzer, até que em 2005 foi eleito membro da direção da instituição. Artigo distribuído pelo New York Times News Service.
Opiniões expressas aqui são de exclusiva responsabilidade do autor e não necessariamente estão de acordo com os parâmetros editoriais de Terra Magazine.
 
 
 
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